quarta-feira, 22 de maio de 2013

Just like a dream...







Existe aquela história que diz que, um segundo antes da gente morrer, todas as imagens dos acontecimentos ao longo das nossas vidas passa pela nossa cabeça. Eu não queria começar esta resenha dessa maneira mórbida, mas essa é uma boa analogia que consegue explicar o que aconteceu naquele sábado, desde o momento que acordei até quando fui dormir, às quatro da manhã do outro dia, depois de um 6 de abril que incluiu a noite que o The Cure tocou pela primeira vez em São Paulo em 17 anos.

Mesmo tendo lido durante anos resenhas de outros fãs que haviam assistido a banda ao vivo e tinham expressado o quão fantástico tinha sido, ou ter ouvido do Samuel e do David como o show do Rio tinha sido espetacular, eu não estava preparada para o que ia acontecer assim que eu comecei a ouvir Tape tocando.

Eu já conheço o show deles. Já conheço Tape, Open, High... Todas as 40 que eles tocaram, depois de tanto tempo vendo os mesmos vídeos delas sendo tocadas ao vivo. Mas o que acontece ao vivo é algo difícil de explicar. Não importa como as pessoas chegaram lá, que vida elas levam no dia-a-dia, qual tipo de pensamento elas têm. Quando Tape começou, foi como se o Cure tivesse fechado todos dentro de uma redoma de vidro e alguém tivesse jogado um jato de tinta na cabeça de todas as pessoas, de quem ouve e deles próprios, e todos tivessem ficado com determinada cor. E em todo momento, eles jogavam um jato de tinta de cor diferente. Você vai acumulando aquela tinta e ficando todo colorido. No final do show, tão colorido, mal sabe a sua cor. Mal sabe se chegou lá amarelo ou vermelho. E nem acha mais que isso importa. Quer ficar colorido por dias.

Ver o Simon tocando acho que foi mais emocionante do que ver o Robert e, embora eu não admire mais um do que o outro, como músicos, foram as linhas de baixo do Simon que me fizeram enxergar música de uma maneira bem diferente do que eu via antes. Além de começar a tocar baixo, mesmo ter vontade de arranhar outros instrumentos. Vê-lo ao vivo também me fez ter uma imagem dele que eu nunca tinha tido vendo shows em vídeo - diferente dos outros quatro músicos, o Simon e o baixo me pareceram ser uma coisa só. Como se o baixo fosse parte do corpo dele. Sensação bem esquisita, bem maluca. Sempre achei que a naturalidade com que ele toca, e cria os sons no baixo, se equivalem a uma pessoa que fala bem, ou escreve bem sobre os próprios sentimentos. Como se ele 'falasse' com o baixo, a exemplo do Robert que fala através das letras. Perdi a conta das músicas do Cure que ouvi em que o baixo parece falar o que a letra fala. 'How Beautiful You Are' e 'Numb' são dois exemplos.

Fora o fato do homem ter 52 anos de idade e pular durante três horas sem parar. É contagiante ver aquilo, uma paixão pelo que faz que não enfraqueceu com o tempo. Nesse sentido, o Robert não ficou atrás. Há muito tempo ele anda economizando nos vocais - naturalmente -, mas continua cantando com alma e alegria pelo que faz. E lá estava ele na quadragésima música fazendo as versões um pouco mais pesadas - que eu adoro - que o Cure faz de 'Killing an Arab', a plenos pulmões e animado como um moleque de dez anos. E sempre deixando o palco passando uma sensação de que queria tocar só mais uma.

Robert terminou o show de São Paulo com seu 'see you again soon' um tanto convencional. Dizer isso na França é diferente de dizer no Brasil. No Brasil soou um pouco triste, porque a gente aqui sabe que este foi o último show do The Cure por estas terras. De qualquer forma, as lembranças daquele dia foram tão intensas que eu quase posso embrulhá-las numa caixa e guardá-las, para revisitar quando quiser. Poucos dias são flores sem espinhos na vida da gente, e aquele dia não foi diferente. Mesmo assim, não há nada que eu gostaria que fosse mudado.

Muito bom poder compartilhar esse momento com meus amigos e companheiros de banda, o David e o Samuel, pessoas que eu gosto muito e com quem eu compartilho as coisas sobre o The Cure há muito tempo. Fico feliz que a minha lembrança desse show do The Cure também envolva os dois. Bom também ter a Camila, a Carol, o Ian, o Ricardo Zumbido e o Teco por perto enquanto o The Cure tocava.

Nunca gostei muito de 'Fight' mas, por alguma razão, no dia seguinte, era ela que estava vindo na minha cabeça o tempo todo.

Fight fight fight
So when the hurting starts
And when the nightmares begin
Remember
You can fill up the sky
You don't have to give in

Never give in


(Por Tiemi)

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...e toda vez que eu leio esse texto da Ti parece que cai um cisco nos meus olhos...Eita!